Hoje aqui em São Paulo faz um dia quente, porém nublado e chuvoso, o céu está tipicamente dramático tenebroso, como um cenário de dia das bruxas deve ser. Me peguei refletindo sobre a magia da comunicação, sobre a "bruxaria" que acontece quando a gente sente que nossas palavras fizeram mágica nas mais diversas situações.
Lembrei de um episódio de quando eu tinha 10 anos de idade, morava com meus pais e irmã em um bairro da periferia da zona leste da cidade de São Paulo. Era o Sábado quente de uma noite de verão. Ouvimos gritos masculinos vindos de nossa calçada, uma discussão terrível envolvendo um vizinho nosso e o filho de uma grande amiga. Um dos homens, um rapaz filho de nossa amiga, estava armado e furioso. Ele apontava a arma na direção de nosso vizinho. Todos ficaram em choque, porém minha mãe resolveu conversar com o rapaz.
A cena pareceu de filme, até hoje lembro em detalhes: um rapaz alto, forte e musculoso, de pés descalços, sem camisa e com os olhos ardentes, uma voz em fúria, a arma prata cintiliando, apontada na direção de outro homem bem mais velho, também alto e de tronco largo reagindo a insultos de longe, provocando o outro de peito aberto. Quando o rapaz puxou o gatilho minha mãe disse: "Meu filho, olhe para mim. Eu poderia ser sua mãe e me orgulharia muito em ter um filho tão belo e forte como você, eu sempre quis ter um filho menino. Eu ficaria com meu coração partido em ver você acabar com a vida de alguém e com a sua junto ao cometer um crime terrível. Por favor, eu te peço, não faça isso, eu não vou permitir. Se você atirar neste homem eu vou ter que entrar em sua frente, você teria coragem de atirar em uma mulher como eu, que poderia ser a sua mãe, meu filho?". A voz e o olhar de minha mãe eram doces, ternos e apaziguadores, o rapaz olhou para ela e imediatamente abaixou a arma.
Não recomendo a ninguém que se meta em uma briga armada. Porém, esse episódio de minha infância, protagonizado por minha mãe, me ensinou o quanto as palavras são instrumentos mágicos, poderosos e transformadores. Essa percepção muda a direção de nossa comunicação e muito mais do que nos ajudar a falar bem em público, pode nos salvar em situações extremas.
Acredito que toda palavra, assim como toda magia, precisa estar carregada de intenção, postura, entonação, senso do momento, gesto correto para que se atinja o âmago de uma questão. É como uma espécie de ABRACADABRA, uma chave se encaixa na fechadura e desarma o que precisa ser desarmado, constrói o que precisa ser construído, dissolve o que precisa ser dissolvido, conecta com o que precisa de conexão e abre infinitas possibilidades.
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